domingo, setembro 04, 2005

New Orleans em Maputo

De novo retiro-me ao meu próprio sofrimento, qual egoísmo quando tantos seres sofrem o impensável.

De novo acontece uma devastação da natureza na natureza e onde mais uma vez levamos aquele estalo brutal da falha da engenharia, quem diria, mesmo com todos os avisos.

De novo parei de respirar por uns dias porque eu aqui de África estava à espera de ver "reacção" aos milhares que de repente nem água potável tinham. Eu não entendia como é que não vinha, depois não custou - toda a estrutura estava a aguardar que o "bill" do bush fosse aprovada.

De novo pasmei com as abordagens nacionais e internacionais sobre a tragédia. Estamos a perder o senso comum básco.

De novo chorei por tantas as crianças, todas as que não se conseguem defender. Eu estava a ver a sequela do Mad Max 2030.

Tive o previlégio de conhecer a magia de New Orleans (em português realmente não soa bem). Foi a minha salvação porque ao fim de ter percorrido 3 mil milhas de Estados Unidos de carro, chego à primeira cidade Norte Americana onde consigo comer! Pedi num qualquer restaurante típico creolo a sopa com arroz e feijão, sentada numa cadeira de ferro trabalhada num pátio húmido ao lado do Mississipi a ouvir Blues ao vivo.

A arte, o cosmopolitanismo, a história, origens, beleza, o velho e o novo, o Mardi Gras, as esquinas, todas as esquinas com quartetos ou quintetos a comporem jazz ao vivo soltando notas culturais a troco de um dólar no chapéu. Cada metro percorrido o preenchimento musical, de espectáculo não editado, cru ao vivo dum povo que vim a descobri na sua maioria pobre ou abaixo da média.

Cada esplanada revestida a vidro com cadeiras de 1060 um grupo quase sempre acima dos 40 anos, vestidos a rigor a fazer lembrar não só Luis Armostrong mas todos aqueles que perderama sua vida a querer cantar estas notas tão diferentes de um qualqer outro estilo musical. Senti-me perto do Frank Sinatra.

Quando lá fui tinha 27 anos mas os americanos não acreditavam e pediram-me sempre o passaporte para comprovar que não era under-age.

Enquanto cresci e por culpa do cinema, apaixonei-me pelo Mississipi e não me desiludiu quando o vi fora o cheiro. A beleza arquitectónica da zona velha, a Francesa porque a zona nova não gostei selva de betão que nem uma qualquer outra cidade americana ou sul africana.

Estranhamente, e porque cresci assim, identifiquei-me com esta cidade, apaixonei-me de imediato, já com Miami, Florida, Carolina do Norte, Atlanta não. Faltavam aqueles swamps de Alabama, aquela humidade que me faz lembrar de casa.

Tive a sorte de conhecer esta cidade da Luz dos EUA antes. Não sei como será o depois. Fez-se história. Uma cidade inteira vai ser alterada, vai nascer uma nova. Será que o Mardi Gras vai continuar? Será que vamos retomar as origens do Jazz? Será que vamos perder essa história?

Ontem, em Maputo e no meio de uma actividade desenvolvida (Fama Show, a opreação triunfo de cá) pela STV, num dos melhores se não o melhor restaurante, ao promover talentos Moçambicanos surgem 3 pessoas que foram desafiadas a cantar - Eneas Comiche, Carlos Tembe e Norberto Carrilho e que cada um à sua maneira cumpriram com a tarefa como se tivessem sempre sido cantores. Carlos Tembe em jeito de homenagem ao "Katrina" sai-se com um tema de Luis Armostrong improvisando letras lusitanas que fez parar toda a plateia que o assistia. Incluindo os mais novos. Foi bonito ver que afinal temos a capacidade de olhar para outros umbigos.

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